A notícia do cancelamento – ou adiamento, caso prefira – da
XI Parada da Cidadania LGBT de João Pessoa, que ocorreria no dia 1o
de julho de 2012, caiu como um balde de água fria na expectativa do público que
habitualmente participa dessa manifestação. Por LGBT leia-se lésbicas, gays,
bissexuais, travestis, transexuais e transgêneros, que se trata de um setor não
desprezível da população.
Malgrado o esclarecimento de última hora divulgado nas redes
sociais pelo Fórum de Entidades LGBT da Paraíba, que promove a parada, algumas
questões seminais não foram respondidas, outras vieram à tona, mostrando a
fragilidade de um movimento que mal consegue manter-se em pé, frente à apatia,
à indiferença e à falta de consciência de seu público potencial.
O Fórum, em nota, justifica o adiamento da parada pela falta
de compromisso da Funjope e do governo estadual, que retiraram parte do apoio
que vinha sendo negociado desde março, para a realização do evento. O motivo
alegado foi a falta de instalação de um palco para o show no final da
manifestação, e a redução das atrações prometidas, de três para um cantor/cantora.
Dos quatro trios elétricos programados, contava-se ao certo com um, oferecido
pela OAB. O adiamento, portanto, segundo os organizadores, foi estratégico,
para que não houvesse retrocesso quanto à estrutura do evento.
Por certo, quando se fala em retrocesso, pensa-se na perda
de alguns aparatos chamativos que têm caracterizado as paradas LGBT não só da
cidade, mas em todas as outras promovidas em nível nacional. O número de trios
elétricos, além do barulho ensurdecedor que causa, serve para impressionar,
para mostrar o poder de barganha das entidades LGBT, já que dinheiro para
bancá-los, definitivamente, não têm. Por outro lado, os trios são palanques
para discursos inflamados e enfadonhos, palco para a reafirmação do engajamento
à causa por alguns políticos.
Os shows que sempre ocorrem no final da parada servem para
brindar o público que se dispôs a acompanhá-la, como uma espécie de apoteose ou
confraternização. Juntamente com os trios elétricos, isso reforça o lado
festivo e carnavalesco da parada, que no fundo se funda quase que
exclusivamente por este caráter. O evento, em si, tem seu perfil político, ao
proporcionar a visibilidade de um segmento que na maior parte do ano se sente
coagido ao recolhimento, por temer a repressão moral e a violência.
Contudo, a
carnavalização da parada como estratégia de mobilização expõe a fraqueza do
movimento.
Ao ver inviabilizada a festa, o Fórum preferiu adiar o
evento certamente por temer, além da perda do glamour, a realidade que não se pode negar: sem a festa não há
parada porque não há compromisso do público com suas questões políticas e
reivindicatórias. São poucos os gays, lésbicas, travestis, transexuais e
transgêneros que têm consciência de si mesmos, de seus direitos ou da falta
deles.
Não há massa crítica disposta à luta, a fazer eco às justas
proposições dos movimentos. O que se tem, em sua maioria, é uma classe intelectual
enrustida, de certo modo confortável em seu anonimato, levando uma vida dupla
como heterossexual em sua representação social, e homossexual, nos recônditos motéis
da periferia. Por outro lado, tem-se também um povo sofrido, humilhado,
ignorante quanto à integridade de si, que vive sua homossexualidade no limite
da marginalidade.
Talvez o recuo dos governos em apoiar a parada seja fruto
dessa constatação, de que o movimento, no fundo não representa muito, porque
esse muito não tem interesse em ser representado. Talvez o descompromisso da
esfera de poder para com um setor tão carente de políticas públicas se dê
também pela proximidade eleitoral, onde rebanhos maiores se tornam o foco das
políticas demagógicas.
O que incomoda mesmo é a falta de autonomia do movimento,
que recua diante do descaso das entidades oficiais. Mais político seria botar o
povo na rua, seja com quantos fossem, fazer barulho da forma mais primária que
se dispõe, aos gritos, mostrar que há vontade política de mudar as coisas, de
se fazer visível, de incomodar, de fazer refletir. Nesse ponto, vejo como muito
mais avançadas outras manifestações que ocorreram recentemente na cidade, como a
Marcha da Maconha e a Marcha das Vadias. Elas foram à rua com quase nenhuma
estrutura, com megafone na mão e de peito aberto, lutando por suas causas e
criando um fato político.
Henrique Magalhães
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